domingo, 31 de março de 2013

Uma crônica sobre domingo.


 Domingo. Existe dia pior que domingo? Eu poderia gastar parágrafos e mais parágrafos falando as mesmas coisas que todos dizem: logo depois de domingo é segunda, na TV a programação é ridícula, e por aí vai. Mas por mais que eu concorde com todos esses argumentos, algo que profundamente me incomoda é o fato do primeiro dia da semana ser o mais preguiçoso de todos também. Apenas compare o barulho que tem segunda-feira às 6h da manhã com domingo às 14h da tarde. É algo totalmente diferente. Óbviamente que domingo é assim pois ninguém trabalha, e é isso que talvez me incomode. NINGUÉM trabalha. O Brasil para por um dia inteiro para sentar em sua poltrona, ligar a sua TV, e ver a programação mais estúpida do mundo.

Eu sei que ao dizer essas coisas estou sendo egoísta e imaturo. Afinal de contas, não sou eu quem trabalha a semana inteira, não sou eu que não tem tempo para pesquisar coisas novas e diferentes da velha e clássica rotina semanal do genérico cidadão brasileiro. Mas talvez, só talvez, eu esteja apenas querendo escapar de algumas coisas que querem vir a tona, mas que eu não posso deixar.

Fui acordado pela minha mãe logo de manhã para que eu ajudasse ela com algo, e logo ao acabar, rapidamente voltei a dormir, pois o sono estava praticamente me obrigando. Culpa de quem? Domingo. A força da gravidade em um dia de domingo aumenta para 11m/s² ao invés dos clássicos 9,8m/s². De qualquer maneira, ao acordar de novo, me senti assustado e pressionado a fazer as coisas rapidamente, como se eu estivesse atrasado para um compromisso, ou quando você pede mais 5 inutinhos pra dormir e esses 5 minutinhos se tornam 40 minutos, e você acaba chegando atrasado no trabalho. Mas logo me veio a cabeça que era domingo e assim a gravidade passou a fazer efeito no meu corpo. Era quase 12:00. Estranhamente minha gripe havia melhorado consideravelmente, o que era muito estranho, mas satisfatório. Aliás, na verdade não é gripe, mas sim resfriado. Apesar de saber a diferença entre os dois sempre acabo trocando as palavras em algum momento, chega a ser chato.

Passando pela cozinha pego um pote cheio de bolachas e sento na cadeira de fronte ao computador, como usual. Ao morder um pedaço da bolacha refleti o porquê de tanto alvoroço logo ao acordar, e eis que me vem à cabeça a responsabilidade. É isso mesmo, responsabilidade. Me lembro que eu tinha que estudar matérias que estavam atrasadas, por culpa da minha pura incompetência em seguir uma rotina eficiente de estudos. Assim que lembrei disso, rapidamente tive de proferir a mim mesmo as mesmas desculpas e reflexões que uso para escapar de qualquer responsabilidade: preguiça, falta de necessidade no momento, falta de peso na consciência durante o momento e aproveitando nosso querido dia, é domingo. Mas é claro, tinha que ser domingo, não é mesmo? Que cidadão em plena sã consciência se preocupa com responsabilidades maiores de domingo? AINDA MAIS em um domingo de páscoa? Certamente eu não. E assim resolvi continuar fazendo minhas usuais perdas de tempo no computador. Se tinha uma coisa para a qual eu estava disposto era ser improdutivo o dia inteiro. Culpa de domingo.

À medida que o tempo passa, minha preocupação vai indo embora, provando a eficácia das minhas desculpas para mim mesmo, e também o quão fraco eu sou. Resolvo desligar o computador e arrumar a casa, pois por mais que eu não goste de fazer isso, me parecia uma boa maneira de me sentir minimamente útil. Como de costume, passei a refletir em como eu sentia falta da minha infância e como as responsabilidades, por mínimas que sejam passam a realmente mudar a maneira como somos e vivemos. Isso, se chama crescer. Crescer é algo difícil. Todos te criam como se você especial, até o momento que você vê outras crianças criadas da mesma forma, e vê que elas são tão especiais quanto você, se não mais especiais. Não por posse exclusivamente material, mas futuramente também por posse intelectual e física. Somos condicionados a viver em sociedade, e é impossível ignorar as mudanças da mesma. Não podemos viver no nosso próprio mundo, é impossível. O mundo não deixa.
Quando você começa a lidar com isso sem problemas, você cresceu. Simples.

Ao acabar com essa reflexão, por algum motivo que absolutamente ninguém no universo sabe, fiquei olhando a janela por alguns minutos. Estava sol. Os vizinhos escutavam algum tipo de sertanejo, que felizmente não estava tão alto. O bairro estava muito quieto, apesar de algumas pessoas estarem celebrando a páscoa. Em poucos momentos escutei duas crianças gritando, como se estivessem brincando. Isso junto da exata posição do sol naquele momento me trouxeram gravuras de quando eu era criança (de novo), e era como se eu estivesse subitamente vivendo no mesmo dia de domingo da minha infância, mas com uma diferença, eu estava em um lugar diferente. Sinto falta desses domingos vagos, das jogatinas de Super Nintendo, das leituras de revistinhas, das caminhadas pelo quarteirão vazio puramente para se entreter com a imaginação, coisa que nunca irei sentir mais. Isso tudo, em um domingo. Tinha que ser culpa de domingo.

Decidi ir de vez estudar, pensando que não havia nada mais a ser feito. Afinal de contas, eu não posso perder tempo, não posso deixar de produzir, cada vez melhor, mais rápido e mais eficiente. Passo a tentar ler algo sobre história, era a introdução ao capítulo, que falava sobre as diferentes eras e períodos históricos. Da Pré-História à Antiguidade, da Antiguidade até a Idade Média e por aí vai. Facilmente me identificando com os conceitos, reflito sobre as minhas reflexões passadas (sim) e sinto como se um desabafo no pensamento não fosse o suficiente, eis que estou aqui escrevendo esta crônica, nesse domingo de páscoa, tentando colocar o sentimento que eu sinto em todos os domingos da semana, nesse texto, buscando não só me desabafar, mas deixar uma dedicatória a esse dia.

É no dia de domingo, que eu sinto medo de perder a responsabilidade e que mesmo com medo eu a perco. Perco para a preguiça que esse dia proporciona, e que me faz sempre refletir e contestar os valores que adquiri quando criança, a memória eterna de domingo sendo o dia mais preguiçoso da semana, o dia em que eu não devo ligar pra nada. Ao culpar domingo pelas minhas falhas, eu indiretamente me culpo pelos meus maus hábitos adquiridos durante minha formação pessoal, e que sem um esforço muito grande não irão mudar, tudo por causa de domingo. E se eu já não culpei domingo o suficiente, o culpo de novo pelo mesmo ter tirado uma hora e quinze minutos para que eu pudesse escrever essa crônica, em homenagem a esse dia. Tempo esse que valeu a pena, pois domingo por mais que seja o pior dia da semana ainda sim consegue me proporcionar boas memórias do tempo em que eu era menor, e mais, faz com que eu conteste meus valores - tudo para que eu possa crescer - e assim assumir de vez a responsabilidade após muito esforço e reflexão.

Um brinde ao primeiro dia da semana! E agora se me permitem, irei sair para continuar meus estudos, e quem sabe reclamar mais um pouquinho. Porque óbviamente é culpa de domingo.
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